quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Marketing e Religião: Quem Manda é a Mulher - Final




9 - Mistério - O mistério é um dos motivadores das religiões. O que existe depois da morte? O que é Deus? Ele existe? Porque estamos aqui? Religiões podem ser usadas como confortos em meio a estas dúvidas estressantes, principalmente às relativas a morte. A incerteza gera medo que desemboca em superstição, que pode ser usada pelo mercado. Por exemplo o das teorias da conspiração. Inúmeros livros e vídeos são lançados sobre o tema e, não raro, utilizado por vários cultos religiosos a fim de instalar o processo de insegurança, como vimos no  item 3 (Poder sobre os Inimigos). O foco padrão desse mercado são homens poderosos como presidentes dos EUA ou empresários como Bill Gates quase sempre ligados a fraternidades secretas e ordens esotéricas um vasto repositório para projeções conspiracionistas - Dan Brown que o diga. Não estou falando de outra coisa senão do cérebro emocional sendo trabalhado.


O mistério também instiga a curiosidade. Não é dito que o proibido é mais gostoso? Parte do que define a Apple é a sua política de segredo. Ela concebe seus produtos da forma mais sigilosa possível visando esconder da concorrência mas gera um efeito interessante de buzz marketing. Os próximos lançamentos da empresa mexem com os neurônios especulativos dando razão de existência a inúmeros blogs e a outros tantos analistas de mercado; muito útil para uma empresa S.A.. Outro mistério bastante conhecido no mercado é a fórmula secreta da Coca-Cola escondida em um cofre em Atlanta que gerou inúmeras tentativas de obtenção pela concorrência e faz parte da mística da empresa.


Mistério também se relaciona com expectativa. A indústria da cultura pop (filmes, quadrinhos, games e livros) vive de expectativa: artes iniciais de histórias em quadrinhos em produção no Facebook, fotos de filmagens secretas, teasers (os pré trailers*), descrições obtidas misteriosamente de trailers, informações obtidas com membros da equipe de filmagem e assim vai. É a manifestação da nossa imaginação, sendo mais projeções de desejos, que é o terreno da dopamina. Não raro a produto final dessas expectativas não corresponde ao imaginado por nós mas aí o já consumidor adquiriu o produto. Como disse o filósofo Nietzche: "Amamos desejar mais do que amamos o objeto de nosso desejo."


10 - Ritualística - Rituais são quase sinônimos de religião. Contém um aspecto de realização de mudanças na natureza ou na própria vida da pessoa, com forte apelo emocional. Certos rituais, como os de iniciação em grupos esotéricos, são fortemente dramatizados para atingir as bases  emocionais dos que deles participam. Rituais envolvem superstição e fé pois são, na maioria das vezes, lidam com resultados incomuns. Quanto maior o clima de insegurança e imprevisibildiade mais as pessoas tendem a comportar-se supersticiosamente para orientar a vida, nesse contexto, rituais são tentativas do controle da realidade.


Mas rituais também são protocolos de comportamento, uma forma de se integrar a um ambiente, seja ele uma casa de família seja uma audiência judicial. A ritualistica se extende aos nosso hábitos diários como os de higiene ou de compra. Hábitos tendem a nos tornar mais estáveis emocionalmente *. Um estudo feito pela BBDO Worldwide mostrou que em 26 países, a maioria das pessoas executa uma serie de rituais diariamente:


  • Preparação para a batalha - acontece pela manhã nas preparações para enfrentar o dia: escovar os dentes, tomar banho, fazer barba, ver os e-mails, entrar no Facebook etc.
  • Banquete - são as refeições com outras pessoas. É um ato social que nos faz membros de um grupo.
  • Ornamentação - ritos que transformam a nossa pessoa comum em seres mais bonitos, mais confiantes. As mulheres são as principais devotas deste tipo de comportamento, portanto um alvo interessante nessa abordagem.
  • Proteger-se do futuro - todos os atos preparatorios para o sono: desligar computadores, luzes, olhar os filhos, trancar a casa, deixar os itens para o dia seguinte prontos. Isso tudo ajuda a sentir-se mais seguro, mais preparado para o dia seguinte.

Há casos em que os rituais de superstição e de hábitos acabam se fundindo, como aquele goleiro que sempre deixa um terço no pé da trave, ou benzer-se antes de pegar a estrada. Essa mistura atinge padrões culturais influenciando numa escala bem maior, como na Ásia onde o número do azar deles é o quatro cujo som, em mandarim, é si próximo de shi, o da morte. Nos hotéis chineses não existe o andar 44. O pesquisador californiano David Phillips descobriu que ataques cardíacos entre cidadãos de origem chinesa residentes nos E.U.A. aumentavam quase 13% no quarto dia do mês. Na Califórnia chega a 27%. Por outro lado, o oito é o número da sorte, cujo som é semelhante a "riqueza" e "prosperidade". Por isso os Jogos Olímpicos de Pequim foram marcados para começar no dia 08/08/08 às 8:08:08 da noite.


Marcas utilizam rituais a seu favor como no caso da cerveja Guinness nas Ilhas Britânicas. Para servi-la corretamente, o garçom enche três quartos do copo. Depois espera-se até que a espuma do colarinho baixe. Então o garçom termina de completar o copo. Demora alguns minutos para que você comece a tomar a cerveja mas os clientes não se importam em esperar; este ritual é parte de se beber uma Guinness. Porém, nem sempre foi assim. No início dos anos 90 a empresa estava tendo problemas com isso, pois a cultura apressada não fazia ninguém querer esperar tanto. Numa jogada de gênio a empresa resolveu fazer da desvantagem uma vantagem lançando a campanha: "Good things come to those who wait" ("Coisas boas vêm para quem espera") e "It takes 119.53 seconds to pour the perfect pint" ("São necessários 119.53 segundos para servir o copo perfeito de cerveja") com comerciais ensinando a servir da maneira correta. A marca soube fazer do ritual parte da experiência em se consumir o produto, estabelecendo um elo emocional entre ele e o consumidor.


Rituais valem mais pela experiência da realização em si do que pelos resultados que se deseja obter com eles, afinal são ações habituais, reincidentes com pouca ou nenhuma base lógica, agindo diretamente no cérebro emocional. Esse processo repetitivo, sendo uma das bases de um ritual, é encontrado em uma exepressiva forma de consumo: coleção.


Colecionadores são os obsessivos de menor grau. O prazer em reunir itens envolve controle da realidade (pelo menos algum aspecto dela), conhecimento de informações restritas a poucos e até algum destaque social. Vira e mexe sempre aparece alguma matéria jornalística sobre algum colecionador. Não deixa de ser um ritual organizar os itens, consertar quando necessário e até mesmo, buscar pelos novos. Segundo o New York Times num artigo de 1981 "Living with Collections" 30% dos estadunidenses tendem a acumular coisas. Em 1995, o ano em que o eBay lançou o seu site, as vendas de artigos de colecionador chegaram a U$ 8,2 bilhões. Sabendo disso, muitas empresas lançam várias linhas de um produto, como as da boneca Barbie para o horror dos país - com elas as mulheres já começam a mandar desde cedo....


Conclusão


Lindstrom verificou se a relação entre marketing e religião transcendia aos dez pontos percebidos por ele. Submeteu 65 voluntários a testes coordenados pela Dra. Calvert. Mostrou a eles uma seqüência de imagens religiosas e de marcas fortes e fracas alternadamente: uma garrafa de Coca-Cola, o papa, um Ipod, uma lata de Red Bull, contas de um rosário, uma Ferrari esportiva, logotipo do eBay, Madre Teresa, um cartão American Express, uma criança rezando, logotipo da Microsoft no fim imagens de pessoas do mundo esportivo, um banco de igreja seguido por David Beckham, o hábito de uma freira e depois a Copa do Mundo. 


Ao examinarem o resultado descobriu que o cérebro registrava praticamente os mesmos padrões de atividade tanto nas imagens de marcas quanto nas religiosas. As imagens das marcas em si geravam mais atividades do que as fotos e as religiosas; tinham mais poder do que as esportivas em ativar as regiões responsáveis pelas lembranças e tomada de decisões. Porém as de astros do esporte realmente ativava o córtex orbifrontal medial inferior, responsável pela sensação de recompensa, da mesma maneira que as imagens dos ícones religiosos. Nas imagens esportivas existe pouca atividade nas regiões de tomada de decisão e informação; é emoção pura e simples.


Se eu fosse destacar uma palavra deste estudo seria emoção. Consumo e religião estão unidos pelo coração, mas ambos possuem objetivos centrais totalmente diferentes - a aquisição de bens materiais não tem muita semelhança em si com o relacionamento com seres superiores. Tão diferentes quanto o homem e a mulher. Mas estes também se unem, de fato, pelo coração.

Doutrinas esotéricas dizem que as emoções são representadas pelo elemento água e ela ocupa aproximadamente 70% do planeta. Curiosamente os mesmos 70% na composição do ser humano. Agora vimos que as emoções ocupam uma grande porcentagem nos processo de tomada de decisão. Será que existe alguma relação? Se alguém encontrar algum estudo neurológico que atribua essa mesma porcentagem na relação razão-emoção me comunique. Irei começar a achar que a mulher realmente manda mais.....


*A Marvel Comics lançou esta semana o tralier de uma cena pós créditos no filme do Capitão América. Trailer de cenas.....


Capítulo I: Quem manda de verdade lá em casa


- ANDERSON, Chris.Free. Editora Campus, 2009.
- JUNIOR, Marino Raul. A Religião do Cérebro. Editora Gente, 2005.
- HASSAN, Steven. Combatting Cult Mind Control. Park Street Press, 1990.
- LEHRER, Jonah. O Momento Decisivo. Editora Best Business, 2010.
- LINDSTROM, Martin. A Lógica do Consumo. Editora Nova Fronteira, 2009.
- NUNES, José Mauro Gonçalves. Apostila de MBA em Marketing, Comportamento do Consumidor. FGV, 2009.
- PINHEIRO, Roberto Meireles. Comportamento do Consumidor . FGV Editora, 2006.
- UNDERHILL, Paco. Vamos às Compras!. Editora Campus, 2009.

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